quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Convite para lançamento: Amor, opressão e liberdade


Nos palcos da história - lançamento


Homens do mar são homenageados em O ARRAIS


O mar é uma outra coisa, não se vive nele com pressa nem se sobrevive a ele com medo. E ninguém sabe isso melhor que os homens do mar, que navegam por águas tantas vezes revoltas sem saber se de lá saem incólumes ou se esses mesmos mares serão, afinal, a sua derradeira morada.
A vida no mar é hostil, dura e perigosa. Ainda assim estes bravos homens, quando obrigados a ficar em terra, sentem-se como peixes fora d’água. Aquela vida entranha-se pela sua pele, e parece que deixam de saber viver quando não estão na faina. É vê-los fitando o mar com olhares perdidos.
E que coragem e loucura levam um homem a, perante um mar revolto, se enfiar por ele adentro em embarcações que comparativamente à dimensão dos oceanos mais não parecem que diminutas cascas de nozes?
“O Arrais” é uma história ficcionada, mas ainda assim tão rente da realidade cotidiana destes homens e com descrições contemplativas de beleza e harmonia, que permite encontrar poesia onde antes, por mais insistentes olhares que deitássemos a essas vidas, víamos apenas aspereza e agruras. A escrita de Alves dos Santos neste “O Arrais” envolve o leitor, transportando-o para a vida das personagens, numa transparência íntima e em ambientes de céu e luz que se vão alterando passo a passo como se fosse o balanço do mar.
Este livro é também, claramente, uma sentida homenagem do autor a todos os homens do mar e em particular aos de Machico, a sua terra.

De facto, a escrita deste livro implicou extensa pesquisa e foram várias as descobertas e revelações que resultaram desse trabalho.”

Boa leitura!



Escritor Alves dos Santos, é um prazer contarmos, mais uma vez, com a sua participação na Revista Divulga Escritor. Conte-nos, quem é“O Arrais”?
Alves dos Santos - Arrais é um termo que veio a cair em desuso, mas que se refere aos capitães ou mestres de embarcações de pesca. É um termo ainda usado em certas zonas piscatórias do mundo lusófono, e em particular na ‘minha’ Ilha da Madeira.
Os arrais são homens donos de uma grande dose de coragem e loucura que os tornam capazes de, mesmo perante um mar revolto, se enfiar por ele adentro em embarcações que comparativamente à dimensão dos oceanos mais não parecem que diminutas cascas de nozes.

Como surgiu inspiração para a escrita de seu livro “O Arrais”?
Alves dos Santos - Devido a ligações familiares, cresci muito perto destes lobos do mar e fui ouvindo suas extraordinárias histórias, nas quais relatavam os mais diversos episódios que vivenciavam em mar e terra: desde a luta por vezes mortal com os oceanos, às dificuldades de viver da arte da pesca sempre tão dependente da imprevisibilidade da natureza.
“O Arrais” é uma história ficcionada, mas estou convicto de que ter crescido ouvindo estas suas lutas diárias serviu como inspiração e motivação para criar este meu novo livro.

Descreva os principais personagens que compõem a obra.
Alves dos Santos - A personagem principal desta obra, como julgo que se adivinha pelo próprio título, é um arrais, que tem a particularidade de não ser conhecido em momento algum do livro pelo seu nome próprio. E isto foi propositado, porque por meio desta personagem, que no fundo encarna um pouco de todos os arrais, quis homenagear todos os homens do mar que tive a honra de conhecer.
E é em torno deste arrais e das suas aventuras e desventuras que esta obra conduz os leitores numa viagem com destino marcado sem que,no entanto,se conheça a rota.
Como julgo que foi muito bem sintetizado pelo meu grande amigo e escritor Tristão de Andrade no prefácio deste meu novo livro, que ele gentilmente acedeu a escrever, ‘manifestamente estamos perante as emoções da partida, da viagem, mas sobretudo da chegada, e sempre com uma única questão de fundo: qual é, afinal, o nosso lugar?’.

O que mais chamou a sua atenção sobre os arrais enquanto pesquisava para a escrita do livro?
Alves dos Santos - De facto, a escrita deste livro implicou extensa pesquisa e foram várias as descobertas e revelações que resultaram desse trabalho. Talvez o que mais tenha chamado a minha atenção tenha sido a forma como muitos destes pescadores, que pareciam quase nômades, levaram a sua arte piscatória um pouco por todo o mundo lusófono e até para além dele.

Leia entrevista completa clicando no link ou imagem abaixo:
http://portalliterario.com/entrevistas/entrevistas-portugal/489-homens-do-mar-sao-homenageados-em-o-arrais

Dois narradores, duas épocas, um livro poderoso e comovente



Uma narradora com 100 anos de idade, que mora em um asilo/hospício há pelo menos 70 anos. E resolve escrever secretamente sobre sua vida e sobre o que levou a esse confinamento. Apesar de tão idosa, ela é extremamente lúcida, inteligente, saudável, do tipo que não precisa nem de óculos para ler. Sua narrativa é suave, filosófica, e, como em toda memória que se preze — ainda mais de quem viveu muitas histórias –, às vezes se perde em meandros e devaneios, embora logo recupere o fio da meada.
Esta é Roseanne e passamos as 350 páginas ansiosos para conhecê-la melhor.

O segundo narrador da história é o doutor Grene, meia-idade, médico do asilo onde vive Roseanne. Ele tem a mesma necessidade de saber um pouco mais sobre a história de sua paciente, movido por uma curiosidade que, no começo, até custamos a entender, mas que aos poucos vai fazendo sentido. Ele também se perde em devaneios durante seus relatos, mesclando o que descobriu de Roseanne com seu dia a dia em casa, onde vive com a mulher, num estado de casamento-divorciado.

Mais do que isso eu não gostaria de contar, porque o mais instigante deste livro é justamente o suspense em torno da história de Roseanne, tão maravilhosamente mantido por essa estrutura de narrativa em dupla e pelo jeito que ela tem de contar as coisas de forma sempre parcelada, como quem lembra e logo se esquece, e vai lembrar de continuar o “causo” apenas dias depois.

Além de serem dois narradores muito diferentes entre si, o que leva a história a mudar de enfoque a todo momento, são também dois tempos muito distantes que se entrelaçam com frequência: o passado remotíssimo em que Roseanne viveu sua juventude (e a parte mais emocionante do livro, para mim, foi da infância dela e do carinho que tinha pelo pai) e o presente que a gente fica querendo entender, intrigados. Pra melhorar tudo, as duas versões da mesma histórias às vezes se contradizem, e ficamos em dúvida sobre no que acreditar, em quem acreditar. No fim, fiz minha escolha.

O autor deste livro, Sebastian Barry, teve que ter grande habilidade para construir essa história de múltiplos tempos e narradores e ainda assim manter seus leitores sempre em linha, sem se perderem. E olha que eu li este livro de forma bastante entrecortada, às vezes passando vários dias sem pegá-lo, mas, assim que retomava, sabia exatamente o que tinha se passado até então. Isso é coisa que só bons escritores conseguem fazer, não é?

Enfim, trata-se de um livro de texto e conteúdo excepcionais. Mas a história é daquelas que dão grande tristeza — e raiva — em vários momentos, pelas injustiças e pelas situações vividas por Roseanne. De apertar o coração. Ainda assim, há também cenas bonitas, de elevar o espírito. E frases que, mesmo soltas, me pareceram tão boas que eu sempre relia depois do ponto final. Como esta passagem, colhida por mim agora, com o livro já concluído, totalmente ao acaso:

“Uma pessoa sem anedotas a alimentar durante sua vida, anedotas que sobrevivem à pessoa, está mais predisposta a se perder completamente, não apenas para a história mas também para a família que viverá depois dela. É claro que esse é o destino da maior parte das almas, reduzir vidas inteiras — não importa quão vívidas e maravilhosas — a nomes tristemente escritos em árvores genealógicas murchas, com datas e pontos de interrogação pendurados nos galhos.
A felicidade de meu pai não apenas o redimiu, mas também o levou às histórias e o manteve ainda vivo em mim, como uma segunda alma, mais paciente e mais agradável dentro de minha pobre alma.
Talvez sua alegria curiosamente não tivesse qualquer motivo. Mas não pode um homem fazer de si mesmo o mais feliz possível nesse estranhos e longos alcances da vida? Acho isso legítimo. No fim das contas, o mundo é de fato belo e, ainda que fôssemos outra criatura que não homens, seríamos, ainda assim, felizes conosco.”

Ou este trechinho:

“Um homem que pode fazer-se feliz diante dos desastres vindouros que o assaltarão, como em geral fazem os desastres, sem benevolência ou generosidade, é um verdadeiro herói.”

Ou esta imagem poderosa:

“Sentar-me aqui para escrever isto, minhas mãos tão velhas quanto as de Matusalém. Veja estas mãos. Não, não, você não pode. Mas a pele é fina como — você já viu as conchas de um peixe-cachimbo? Elas estão espalhadas pela costa da ponta Rosses. Bem, há uma película transparente que cobre essas conchas, como um verniz quase seco. É uma coisa estranha. Assim é minha pele hoje. Imagino que eu possa contar meus ossos. A verdade é que minhas mãos parecem ter sido enterradas por um tempo e depois desenterradas. Elas assustariam você. Há quinze anos não olho no espelho.”

Este último trecho fala outras duas coisas importantes sobre o livro, que eu tinha esquecido de mencionar: que Roseanne escreve conversando conosco, o que eleva ainda mais o grau de intimidade de todas aquelas memórias que ela compartilha. E que ela é mestra em fazer comparações, que criam imagens muito interessantes na nossa cabeça, o tempo todo. Para mim, como já escrevi aqui no blog, saber fazer boas comparações é uma verdadeira arte.

(fonte: https://kikacastro.com.br/2017/11/30/resenha-escritos-secretos/#more-14749)

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Duas crônicas notáveis de Clarice Lispector e Armando Nogueira

Estas duas crônicas irão fazer 50 anos em 2018. Foram publicadas no Jornal do Brasil em março e abril de 1968. A primeira foi escrita por Clarice Lispector, provocada pelo jornalista Armando Nogueira que afirmara "trocaria de bom grado uma vitória do meu time por uma crônica de Clarice Lispector sobre futebol". 
Ela atendeu, publicou uma crônica admirável e desafiou Armando a escrever sobre a vida. 
Leiam e fiquem maravilhados, como eu fiquei na época e fico sempre que releio.



“Armando Nogueira, futebol e eu, coitada”
(Jornal do Brasil, 30 de março de 1968)





E o título sairia muito maior, só que não caberia numa única linha.
Não leio todos os dias Armando Nogueira – embora todos os dias dê pelo menos uma espiada rápida – porque “meu futebol” não dá pra entender tudo. Se bem que Armando escreve tão bonito (não digo apenas “bem”), que às vezes, atrapalhada com a parte técnica de sua crônica, leio só pelo bonito. E deve ser numa das crônicas que me escaparam que saiu uma frase citada pelo Correio da Manhã, entre frases de Robert Kennedy, Fernandel, Arthur Schlesinger, Geraldine Chaplin, Tristão de Athayde e vários outros, e que me leram, por telefone. Armando dizia: “De bom grado eu trocaria a vitória de meu time num grande jogo por uma crônica…” e aí vem o surpreendente: continua dizendo que trocaria tudo isso por uma crônica minha sobre futebol.
Meu primeiro impulso foi o de uma vingança carinhosa: dizer aqui que trocaria muita coisa que me vale muito por uma crônica de Armando Nogueira sobre digamos a vida. Aliás, meu primeiro impulso, já sem vingança, continua: desafio você, Armando Nogueira, a perder o pudor e escrever sobre a vida e você mesmo, o que significaria a mesma coisa.
Mas, se seu time é Botafogo, não posso perdoar que você trocasse, mesmo por brincadeira, uma vitória dele nem por um meu romance inteiro sobre futebol. Deixe eu lhe contar minhas relações com futebol, que justificam o coitada do título. Sou Botafogo, o que já começa por ser um pequeno drama que não torno maior porque sempre procuro reter, como as rédeas de um cavalo, minha tendência ao excessivo. É o seguinte: não me é fácil tomar partido em futebol – mas como poderia eu me isentar a tal ponto da vida do Brasil? – porque tenho um filho Botafogo e outro Flamengo.
E sinto que estou traindo o filho Flamengo. Embora a culpa não seja toda minha, e aí vem uma queixa contra meu filho: ele também era Botafogo, e sem mais nem menos, talvez só para agradar o pai, resolveu um dia passar para o Flamengo. Já então era tarde demais para eu resolver, mesmo com esforço, não ser de nenhum partido: eu tinha me dado toda ao Botafogo, inclusive dado a ele minha ignorância apaixonada por futebol. Digo “ignorância apaixonada” porque sinto que eu poderia vir um dia apaixonadamente a entender de futebol. E agora vou contar o pior: fora as vezes que vi por televisão, só assisti a um jogo de futebol na vida, quero dizer, de corpo presente. Sinto que isso é tão errado como se eu fosse uma brasileira errada.
O jogo qual era? Sei que era Botafogo, mas não me lembro contra quem. Quem estava comigo não despregava os olhos do campo, como eu, mas entendia tudo. E eu de vez em quando, mesmo sentindo que estava incomodando, não me continha e fazia perguntas. As quais eram respondidas com a maior pressa e resumo para eu não continuar a interromper. Não, não imagine que vou dizer que futebol é um verdadeiro balé. Lembrou-me foi uma luta entre vida e morte, como de gladiadores. E eu – provavelmente coitada de novo – tinha a impressão de que a luta só não saía das regras do jogo e se tornava sangrenta porque um juiz vigiava, não deixava, e mandaria para fora de campo quem como eu faria, se jogasse (!). Bem, por mais amor que eu tivesse por futebol, jamais me ocorreria jogar… Ia preferir balé mesmo. Mas futebol parecer-se com balé? O futebol tem uma beleza própria de movimentos que não precisa de comparações.
Quanto a assistir por televisão, meu filho botafoguense assiste comigo. E quando faço perguntas, provavelmente bem tolas como leiga que sou, ele responde com uma mistura de impaciência piedosa que se transforma depois em paciência quase mal controlada, e alguma ternura pela mãe que, se sabe outras coisas, é obrigada a valer-se do filho para essas lições. Também ele responde bem rápido, para não perder os lances do jogo. E se continuo de vez em quando a perguntar, termina dizendo embora sem cólera: ah, mamãe, você não entende mesmo disso, não adianta. O que me humilha. Então, na minha avidez por participar de tudo, logo de futebol que é Brasil, eu não vou entender jamais? E quando penso em tudo no que não participo, Brasil ou não, fico desanimada com minha pequenez. Sou muito ambiciosa e voraz para admitir com tranquilidade uma não participação do que representa vida. Mas sinto que não desisti. Quanto a futebol, um dia entenderei mais. Nem que seja, se eu viver até lá, quando eu for velhinha e já andando devagar. Ou você acha que não vale a pena ser uma velhinha dessas modernas que tantas vezes, por puro preconceito imperdoável nosso, chega à beira do ridículo por se interessar pelo que já devia ser um passado? É que, e não só em futebol, porém em muitas coisas mais, eu não queria só ter um passado: queria sempre estar tendo um presente, e alguma partezinha de futuro.
E agora repito meu desafio amigável: escreva sobre a vida, o que significaria você na vida. (Se não fosse cronista de futebol, você de qualquer modo seria escritor.) Não importa que, nessa coluna que peço, você inicie pela porta do futebol: facilitaria você quebrar o pudor de falar diretamente. E mais, para facilitar: deixo você escrever uma crônica inteira sobre o que futebol significa para você, pessoalmente, e não só como esporte, o que terminaria revelando o que você sente em relação à vida. O tema é geral demais, para quem está habituado a uma especialização? Mas é que me parece que você não conhece suas próprias possibilidades: seu modo de escrever me garante que você poderia escrever sobre inúmeras coisas. Avise-me quando você resolver responder a meu desafio, pois, como lhe disse, não é todos os dias que leio você, apesar de ter um verdadeiro gosto em ser sua colega no mesmo jornal. Estou esperando.

E a resposta de Armando Nogueira veio alguns dias após:

Na grande área
Jornal do Brasil, 8 de abril de 1968 




Clarice Lispector: há uma semana, não encontro no Rio uma pessoa amiga que não me pergunte: “Então, quando é que você vai aceitar o desafio da Clarice Lispector”?
(Permita, leitor, explicar que eu tinha pedido, daqui, uma crônica de Clarice Lispector sobre futebol. Ela escreveu, escreveu uma crônica admirável; mas, num impulso de terna vingança, Clarice me multou: desafiou-me a perder o pudor e escrever sobre a vida).
Agora, os cobradores de Clarice estão à minha porta, carinhosamente, exigindo a resposta, mas com uma impaciência que me angustia como a véspera de um grande jogo.
Que dizer de um jogo que ainda não terminou?
E mesmo quando termine, Clarice, o match de minha vida não justificará sequer resenha: é match-treino, sem placar, sem juiz, nem multidão. Por tudo! Que está bom assim, embora melhor se fosse uma pelada – mil meninos jogando a minha vida, alheios ao vento que às vezes persegue tanto o time da gente.
Jamais seria um bom depoimento de minha própria vida: jogo muito mal, sofro a imprecisão de meus chutes. Tenho medo e respeito muito o julgamento da plateia. Embora também já tenha tido vergonha da multidão. Eu te conto, Clarice: era um jogo de grande importância, no Maracanã. O ídolo errou o primeiro passe, errou o segundo, o terceiro. Deram-lhe uma vaia. O ídolo lutava, dignamente, mas seu esforço era vão, a bola de ferro não lhe saía dos pés. A multidão já passava da reprovação ao deboche; e o ídolo, ali, firme, correndo entre dois abismos – humilhação e fadiga. Chamaram-no de venal; ele chorou em campo.
Depois do jogo, a um canto do vestiário, ele me confessava, ainda em lágrimas:
– Armando, eu sei que joguei muito mal. Mas eu não tinha cabeça para pensar. Essa gente não sabe, mas eu vim jogar, deixando minha filha, de cinco anos em casa, com minha mulher doente e uma irmã de minha mulher, louca, trancada no quarto. Mas louca de hospício. Louca de passar o dia jurando que ainda vai estrangular a minha filha. E eu, no campo, só pensava nisso: meu Deus, será que ela não está estrangulando a minha filha?
Nesse dia, eu descobri que nem sempre a voz do povo é a voz de Deus e que às vezes a multidão é capaz até de torcer pelo estrangulamento de uma criança.
O match de minha vida, querida Clarice, tem sido um sofrido aprendizado de todos os sentimentos que murcham e florescem num jogo de futebol: o amor, o medo, o ódio, a inveja, a coragem ali estão, revestindo ou informando cada gesto da bola, cuja meta é sempre o coração – para viver uma grande alegria ou para morrer de infarto.
Infelizmente, jamais conquistei um lugar de jogador nesse misterioso torneio que acompanho, há quarenta anos, como simples espectador. Tentei ser goleiro. Queria sentir o único pedaço de campo em que a grama verde não vinga jamais. Cheguei a mentir, enfiando joelheiras, um boné na cabeça e dizendo aos outros meninos que era o Batatais. Deve ter me ficado da experiência uma visão pessimista do campo. Mas pelo menos duas lições aprendi com dois goleiros: com Evutchenko, “que a vida não é só atacar, é também vigiar os menores movimentos do adversário e conhecer suas artimanhas”; e com Albert Camus que o futebol ensina tudo sobre a moral dos homens.
Por fim, Clarice, o match de minha vida não registra um instante sequer de plena felicidade, embora alguns espectadores o vejam como um alegre amistoso de portões abertos. Marca-me, cerrado, um sentimento de culpa, a dividir comigo as bolas de sabão de cada gol perdido.
Se não deploro, também não tenho o que festejar no match da minha vida: o grito que glorifica o goleador é o mesmo que mortifica o goleiro.
Por isso, não vejo na vitória mais verdade que na derrota.
O match de minha vida, Clarice, está por aí, rolando numa bola que já não é de meia, nem de gude: bola de tantos sonhos perdidos pela linha de fundo – círculo, inspiração do sol, forma perfeita, esfera de fogo queimando, às vezes, a grama dos meus campos.
Que o match da minha vida possa ao menos terminar em paz – empate.
 

A aula de Filosofia enquanto experiencia filosófica

Entrevista com o autor Fábio Antônio Gabriel

Sou licenciando em filosofia, especialista em ética e bacharel em teologia. Mestre em educação pela UEPG, e pela mesma universidade, sou atualmente doutorando (bolsista CAPES/Fundação Araucária). Gosto muito de estudar filosofia contemporânea com ênfase em ética. Acredito que a existência é única e necessita ser refletida para encontrarmos o sentido para a nossa vida.
Defendo o respeito à dignidade da pessoa humana como um valor ético fundamental. Sou organizador de alguns livros pela Editora Multifoco. Entre outros, relaciono: Diálogos Contemporâneos entre Filosofia e Educação (2017); Ensaios entre Filosofia e Educação (2016); Educação Contemporânea em Perspectiva (2015).
“O objetivo é divulgar uma perspectiva de entendimento do ensino de filosofia que entende a filosofia como meio para a criação de conceitos.”
Boa leitura!

Escritor Fábio Antonio Gabriel, é um prazer contarmos com a sua participaçãona revista Divulga Escritor. Conte-nos, o que diferencia um pensamento filosófico de um pensamento comum?
Fábio Gabriel - Parto da ideia de Gramsci de que todos os homens são filósofos. Acredito que todas as pessoas estão a filosofar, mesmo que não saibam a razão desse pensar; o que nos diferencia dos outros animais é justamente a capacidade de pensar e, consequentemente, de filosofar. Por outro lado, baseio-me no filósofo Deleuze para dizer que a filosofia é a arte de criar conceitos. Então responderei esta questão dizendo que um pensamento filosófico tem como especificidade ser um pensamento conceitual. Ao longo do livro “A aula de Filosofia enquanto experiência filosófica” procuro destacar que é importante que a aula de filosofia não seja algo distante da própria existência.

Em que momento pensou em escrever “A aula de Filosofia enquanto experiência filosófica”?
Fábio Gabriel - Na verdade, trata-se da minha pesquisa de mestrado sobre ensino de filosofia que acabou se transformando em um livro. Transformei-a em livro para poder socializar os resultados da pesquisa de doutorado.

Quais os principais objetivos a serem alcançados por meio do conteúdo apresentado nesta obra?
Fábio Gabriel - O objetivo é divulgar uma perspectiva de entendimento do ensino de filosofia que entende a filosofia como meio para a criação de conceitos.

Apresente-nos a obra


Fábio Gabriel –O livro“A aula de filosofia enquanto experiência filosófica” destaca-se como uma obra que evidencia as pesquisas do professor de filosofia Fábio Antonio Gabriel. Neste trabalho, o autor problematiza a possibilidade de um ensino de filosofia que não esteja centrado no enciclopedismo, mas no conhecimento de filósofos, propondo um ensino de filosofia que se relacione com a existência dos próprios interlocutores. O subtítulo:“Possibilitar ao estudante de filosofia criar conceitos e avaliar o valor dos valores” descortina um entendimento das contribuições teóricas de Deleuze e de Nietzsche apresentadas no livro. A obra revela a pesquisa de mestrado sobre ensino de filosofia, realizada na Universidade Estadual de Ponta Grossa.
A orientadora, Profa. Dra. Ana Lúcia Pereira, assim afirma no prefácio: “A pesquisa de Fábio Antonio Gabriel vem ao encontro de estudos que revelam que quando a aula de Filosofia permite ao estudante criar conceitos e ou avaliar o valor dos valores está se permitindo realizar uma experiência filosófica muito além do enciclopedismo. O autor destaca ainda que essas atividades (criar conceitos e avaliar o valor dos valores) relacionam-se intimamente, na medida em que, ao criar conceitos, o estudante estará repensando seusvalores e avaliando os valores vigentes na sociedade contemporânea, na sociedade em que se insere, da mesma forma que, ao avaliar o valor dos valores, o estudante também estará recriando conceitos e criando novos conceitos”.

Como seria uma aula de Filosofia enquanto experiência filosófica?
Fábio Gabriel - Uma aula de filosofia enquanto experiência filosófica é uma aula que relaciona os teóricos da filosofia com a vida. O enciclopedismo tende apenas a transmitir os conhecimentos filosóficos sem relacioná-los com a existência, e isso acaba limitando o âmbito da filosofia. Acredito que a filosofia deve estar relacionada com a própria existência das pessoas e, assim, penso que a filosofia deva contribuir para uma existência mais significativa de quem tem contato com ela.

Onde podemos comprar o seu livro?
Fábio Gabriel - O livro está disponível no site da Editora Multifoco – no link - https://editoramultifoco.com.br/loja/product/a-aula-de-filosofia-enquanto-experiencia-filosofica/ e também pode ser localizado pelo meu site www.fabioantoniogabriel.com


Trilogia A Caverna Cristalina é destaque

Entrevista com a autora Christiane de Murville

Graduada, mestre e doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo, com especialização em psicodrama e orientação profissional, Christiane Isabelle Couve de Murville dedicou sua carreira ao atendimento psicológico individual e grupal de crianças, jovens e adultos, oferecendo oficinas de teatro espontâneo em contextos variados.
Bacharel em Ciência da Computação pela USP, sua dissertação de mestradofoi publicada pela editora Casa do Psicólogo. Morou sempre no Brasil, apesar da dupla nacionalidade brasileira e francesa. Publicou a trilogia “A Caverna Cristalina” e a novela “A vida como ela é”, no Brasil e na França, além de livros e artigos acadêmicos. Tem experiência artística em escultura, desenho, pintura e cerâmica e faz as ilustrações de seus livros.
“Além da aventura, da ficção e do conteúdo histórico apresentado, a trilogia também revela um lado espiritual, que vai se tornando mais evidente ao longo da história, promovendo reflexões sobre o mundo onde vivemos e o que estamos fazendo aqui.”
Boa Leitura!

Escritora Christiane de Murville, é um prazer contarmos com a sua participação na Revista Divulga Escritor. Conte-nos, como surgiu inspiração para escrever a trilogia “A Caverna Cristalina”?
Christiane de Murville - A trilogia “A Caverna Cristalina” surgiu da vontade de compartilhar algumas ideias e reflexões que considero interessantesa respeito da vida e do mundo no qual vivemos. Por meiode uma leitura agradável e fluida, imaginei proporcionaraos meus leitores momentos de descontração, inspirando-os a buscar realidades mais alegres, leves e vibrantes, contribuindo de algum modo para tornar o nosso mundo mais luminoso.

Apresente-nos a trilogia.
Christiane de Murville - Trata-se de um romance de aventura e ficção que conta a história de um grupo de pesquisadores que vivem experiências de portais dimensionais em uma caverna cristalina, situada na Chapada Diamantina, na Bahia. A formação geológica do local, o poço de águas transparentes no centro, a janela no alto e os efeitos acústicos e luminosos que invadem o ambiente cristalino ocasionam viagens no tempo, levando a turma ao passado do vilarejo de Igatu. Nessas idas e vindas no tempo, são sempre as mesmas pessoas se reencontrando nas diferentes realidades visitadas. Passado, presente, futuro, morte e renascimento se entrelaçam, conferindo à vida uma nova dimensão, trazendo à tona um mundo invisível, muitas vezes desconsiderado ou esquecido, e convidando o leitor a considerar diversas realidades possíveis coexistindo.



De que forma se apresenta o enredo em cada trama que compõe a trilogia?
“A Caverna Cristalina – Uma aventura no tempo” - Acompanhando as aventuras dos viajantes do tempo da Chapada Diamantina, o leitor descobre a história da região, desde o apogeu da extração do ouro e dos diamantes, passando pela decadência da mineração, até os dias de hoje. Houve um tempo em que Xique-Xique de Igatu chegou a ter 10 mil habitantes, cassinos, cabarés e bairros de escravos na periferia. Hoje, Igatu é um povoado de aproximadamente 600 habitantes que vive essencialmente do turismo. Ao se deparar com cenários absolutamente estranhos e, em alguns casos, até mesmo hostis, a turma que se percebe no passado de Igatu terá que encontrar um meio de retornar ao seu tempo, para a realidade de onde veio.

“A Caverna Cristalina – O desafio do labirinto” - Inveja, incompreensão, medo e curiosidade se espalham entre os habitantes da região, e a situação se tumultua com o surgimento de movimentos contrários à realização dos experimentos na caverna cristalina, tornando ainda mais desafiadora e instigante a aventura na Chapada Diamantina. Uma velha mina de ouro e diamantes abandonada, cuja entrada secreta se dá por uma cachoeira, torna-se um refúgio seguro para aqueles que anseiam por desvendar os mistérios dessas idas e vindas no tempo. Porém, eles terão que explorar os corredores da velha mina, que esconde um labirinto cheio de surpresas, para reencontrar o caminho de volta para a caverna cristalina e o portal de saída da realidade na qual se encontram.

“A Caverna Cristalina – Capturados no tempo” -  Não se trata mais de ir ao passado ou futuro de Igatu, mas de lidar com realidades alternativas possíveis coexistindo no tempo. Ora a turma se percebe em um mundo onde tudo acontece de forma mais lenta, ora em outromais acelerado, ou ainda onde não parece haver distâncias a percorrer ou separação entre uns e outros. A sensação de passagem de tempo varia conforme a realidade visitada, sendo que esta última ganha evidência em função das intenções, dos sentimentos e pensamentos emitidos. As emoções experimentadas a cada instante e as escolhas feitas abrem novos caminhos e realidades possíveis, levando alguns a se perguntarem se seria possível fugir de realidades sofridas e se bandear para um mundo alternativo mais de acordo com suas expectativas e seus sonhos particulares. Percebendo-se capturado no tempo, cada integrante do grupo dos viajantes da Chapada Diamantina terá que descobrir como se libertar de suas projeções pessoais e desses mundos paralelos.

Quais os principais personagens que compõem“A Caverna Cristalina”?
Christiane de Murville - Samuel é um professor universitário, biólogo e historiador, que coordena um grupo de estudos transdisciplinares. Integram esse grupo o engenheiro Eli, a psicóloga Sofia, o veterinário Tobias, as estudantes Isa, Theodora e Hannah, Victor, da área de informática, e sua namorada, Flora. Também participam dos estudos o geólogo Dan, sua esposa arquiteta e seus filhos Benjamin e Rafaela.Em Igatu, a turma encontra Noel, o supervisor do Parque Nacional da Chapada Diamantina, o índio Ibiajara, o pajé Acauã, o Sr. Alvino, funcionário da pousada; dona Mathilda, da casa de especialidades regionais, entre outros. São muitas personagens, e cada umadelas ganha evidência conforme os desafios que se apresentam.

Leia entrevista completa clicando no link abaixo: