quarta-feira, 2 de agosto de 2017

O Amanuense Belmiro de Cyro dos Anjos



Antônio de Paiva Moura


Ciro Versiani dos Anjos nasceu em Montes Claros MG, no dia 5 de outubro de 1906. Em 1923 transferiu-se para Belo Horizonte, onde cursou direito na UFMG, graduando-se em 1932. Durante o tempo de estudante trabalhou nos jornais Diário da Tarde, Diário do comércio, Diário da Manhã, diário de Minas, A tribuna e Estado de Minas. Seis anos depois de formado foi diretor da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais. Foi professor de literatura na Faculdade de Filosofia da qual foi um de seus fundadores. Foi no período que era colaborador do jornal A Tribuna, que escreveu seu primeiro romance “O amanuense Belmiro” (1937) Cyro dos Anjos tem uma longa folha de exercício de cargos no alto escalão da República, além de altas condecorações e premiações literárias. 



            O romance O Amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos, publicado em 1937 reflete a tendência segundo momento do Modernismo no Brasil. Belo Horizonte é uma cidade nova que reúne intelectuais e artistas vindos de outras partes do Estado e do país.  Há produção artística em todas as áreas: teatro, cinema, literatura, artes plásticas e música. Jornais, revistas e rádio têm programas específicos para divulgação das produções artísticas. O Amanuense Belmiro tem ligação com essa efervescência cultural da cidade. O tema de Cyro dos Anjos vai na contra mão da temática do mandonismo do sertão. 

            O personagem principal, Belmiro Braga é um rapaz que, na década de 1930, se transfere de Montes Claros para Belo Horizonte, na companhia de duas irmãs já idosas, Emília e Francisquinha.  Os funcionários públicos que faziam escritas manuais eram chamados de “amanuenses”. Belmiro era funcionário da Secretaria de Agricultura como amanuense. Daí o nome do livro. Belmiro percebe que leva vida monótona e insignificante. Falta a ele status de família, diploma e dinheiro. Chega a Belo Horizonte com a bagagem da cultura tradicional adquirida em sua cidade natal e na vida familiar. Mas tenta adaptar-se a um novo modo de vida que, ao contrário de Montes Claros, só podia conhecer e se relacionar com poucas pessoas. Por isso, entre a repartição na qual trabalha e sua residência, passa fazer parte de um grupo heterogêneo de pessoas, que ocupa boa parte do tempo de sua vida. 

            Alguns episódios marcam a vida de Belmiro e revelam seu caráter e sua timidez. Em um baile de carnaval, em 1935, brincou com uma garota de máscara, mas a perdeu de vista. Mais tarde nutre uma idéia de que a bela moça é Carmélia e passa a amá-la de forma platônica. Mas Carmélia acaba se casando com um médico. Do grupo de amizade Redelvim é o mais próximo de Belmiro. Seu amigo Glicério tenta conquistar Carmélia, fazendo Belmiro sofrer. Jandira é uma mulher livre e avançada para a época, embora não estivesse sexualmente disponível a nenhum componente do grupo. Há no grupo, diversas tendências ideológicas como socialismo, anarquismo e reacionário, como Silviano. 

            O autor coloca no personagem Belmiro um tipo psicológico muito sintonizado com o modo de ser do mineiro: sensível, amigo das artes e das pessoas. Enfim, um sujeito sonhador, um pequeno burguês idealista.  Entristece-lhe a condição de celibatário, mas não tem coragem de ter gesto ousado diante das mulheres. Ele mesmo diz: “Construí uma Carmélia cerebral que me causava devastações”.  Em “O Amanuense Belmiro”. Cyro dos Anjos explicita Minas Gerais e Belo Horizonte, por meio do personagem narrador, nos primórdios do século XX; o papel social da mulher na sociedade, além do contraste entre a vida rural e a urbana. 

            O que inscreve “O Amanuense Belmiro” na égide modernista de Minas Gerais é a sua ruptura com o romance voltado para a vida de grandes potentados regionais a exemplo “São Bernardo”, de Graciliano Ramos; os conflitos armados; vida de personalidades históricas. A obra de Cyro dos Anjos não tem o cânone do “final feliz”, nem mocinho e nem vilão, mas deixa no leitor uma indagação sobre a alma humana; um balanço de si mesmo e do mundo.

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